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As chuvas, a volta para casa e o paraíso

por Ana Flávia Chrispiniano

Que Gandhi me perdoe, mas minha vontade mais primitiva na volta pra casa de hoje era pegar o Kassab e o Alckmin pelo braço e jogar na enxurrada pra ver se nadavam. Se dependesse de consciência pesada, calculo que não afundariam. Até agora não deram nenhuma declaração a respeito das calamidades que os paulistanos vêm enfrentando este verão, de onde concluo que para eles uma chuva que durou 20 minutos parar a cidade às três da tarde está dentro da absoluta normalidade.

Na Estação República do metrô, as filas na catraca estavam tão grandes que uma moça comentou, brincando: “Já são seis horas?” Ou seja, se fosse seis horas tudo bem porque a gente já tá acostumado…mas às três não! Ok, a moça disse a frase sem pensar e eu sou uma chata. Mas não consigo deixar de pensar que é um problema deixar de pensar que pode ser diferente!

Isso é o mais triste: o povo enfileirado que nem gado, olhando pro céu a procura do réu e achando graça da desgraça. Até quando a gente vai adaptar nossas vidas privadas a situações absurdas – correndo riscos de proporção real nas ruas ou imaginando proporções distorcidas pela TV, trancados em casa – e ser coniventes com o abandono dos bens públicos?

Se ao invés de reclamar dos impostos, fosse cobrado o bom uso do dinheiro; se ao invés de reclamar dos protestos que atrapalham o trânsito se fizesse um protesto contra o trânsito…Talvez assim nossos representantes se lembrassem mais de nós. Talvez assim nossos representantes se lembrassem que nos representam.

Mas é cada um por si, Deus mandando chuva pra todos e uns bonecos de cera sendo eleitos e reeleitos para ocupar as cadeiras do Executivo e apenas fingir que o Estado ainda existe em São Paulo.

 

Mais do que nunca, impera por aqui a tal visão do Estado como mero gerente do grande mercado da vida. E não se fala mais nisso. Se resolver tocar no assunto, provavelmente terá a sensação de não ser ouvido, ou de falar uma língua morta/incompreensível. É latim ecoando num longo corredor vazio, onde o  que interessa é saber como ganhar dinheiro pra salvar a própria pele.

A grande maioria dos livros que vejo se abrirem no metrô (em pé, com desconforto pra virar a página)versam sobre um paraíso qualquer a ser alcançado após a morte ou num futuro próximo, caso você “seja esperto e aprenda a enriquecer dormindo”.

Isso me preocupa. E não sou pessimista, pelo contrário. Só quero que a gente possa alcançar o Paraíso que está logo ali, a algumas estações.

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Enchentes, Sabesp e a imunidade midiática dos tucanos em São Paulo

Parte substancial da cheia no rio Atibaia, que atinge uma série de cidades ao longo da Rodovia Dom Pedro I [Atibaia, Nazaré Paulista, Bom Jesus dos Perdões etc…] , é responsabilidade da Companhia de Saneamento Básico de São Paulo, a Sabesp, empresa estatal do governo de José Serra. Simples assim. Mas acho que isso não vai ser dito, divulgado ou discutido na imprensa. Simples assim de novo.

O essencial da história está nesse link de um jornal local de Atibaia. Resumindo: a Sabesp não desassoreou os rios da região, nem permitiu que as prefeituras locais fizessem isso. A Sabesp sabia em setembro que a represa estava em 85% de sua capacidade, quando o normal é começar o período das chuvas em 45% [e sair dele com em torno de 90% dessa capacidade]. A Sabesp poderia, gradualmente, desde setembro, liberar água da represa aos poucos, para evitar a situação atual, quando o sistema está com 97% de sua capacidade, e tendo que liberar uma quantidade enorme de água para não colapsar. Você pode monitorar os mananciais no site da Sabesp . A prova que o problema era previsível, para ser mais exato, que tinha sido previsto pela empresa faz meses pode ser encontrada em uma matéria do Estado de S.Paulo de 30 de setembro.

Mas se você leu a matéria do Atibaia News soube que então a Sabesp decidiu não adotar a prática constante de liberar aos poucos água da represa. E por que? O jornal levanta a hipótese de interesse financeiro, já que para Sabesp, água é dinheiro. E desassoreamento de trechos de rio abaixo das represas é só custo…

Está claro que a empresa tinha [tem] capacidade técnica para identificar e resolver o problema. O erro foi de gestão e decisão política. Essa devia ser a responsabilidade apontada. Como deve ser em caso de erros do governo federal, municipal etc…Sempre.

Mas os tucanos tem imunidade midiática em São Paulo. Não quero dizer com isso que não saem matérias contra eles, ou dados na imprensa que revelam os descasos do governo, como a completa incapacidade de adotar a lei que implanta o ensino de espanhol no ensino [ na Folha de S. Paulo, para assinantes]. Mas esses flagrantes de descaso e incompetência tem pouco destaque e não se chega aos verdadeiros responsáveis.

Os tucanos administram São Paulo faz 15 anos. Herdaram um banco supostamente quebrado que foi federalizado [o Banespa] e que hoje faz a alegria e salva mundialmente com seus lucros o grupo espanhol Santander. Em 15 anos os tucanos não conseguiriam gerenciar o outro banco do estado, a Nossa Caixa, tendo que vendê-lo para os “incompetentes” do governo federal. Veja bem: os tucanos não conseguiram gerir dois bancos em São Paulo, e o estado hoje não tem nenhum. Querem gerir 3 no governo federal [BNDES, Caixa Econômica e Banco do Brasil], fora o Banco Central.

A Sabesp  é outro nó. Uma empresa gigantesca, lucrativa, mas que falha em ampliar seus serviços no ritmo necessário para a saúde da população e o meio ambiente do estado, e cujos lucros são usados para o caixa do tesouro, ao invés de reinvestidos ou das taxas de água e esgoto se tornarem mais baratas. Isso quando não financia a propaganda de Serra fora do Estado.

Aparentemente a empresa está aparelhada para fins políticos, seus recursos são usados como caixa do tesouro e não propriamente reinvestidos e ela não gerenciou da melhor maneira possível o sistema Cantareira, o maior e mais importante da empresa. Processos devem vir por aí das pessoas afetadas pelas enchentes com prejuízos financeiros ao longo prazo.

Sabe, faz muita falta ao tucanato paulista [e mais ainda a população debaixo dos seus governos] uma fiscalização da imprensa como esta faz em cima das gestões do PT.

Um exemplo é essa matéria da Globo sobre o tema, que culpa a chuva, diz “tudo”, mas não analisa nem explica nada…Ao contrário. A empresa ainda paga de gatinha, moderna e hiper-competente nele…

http://sptv.globo.com/Jornalismo/SPTV/0,,MUL1444350-16576,00.html

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